ACTAS  
 
9/6/2014
Simulação de Assembleia: Saída de Portugal da NATO
 
Nuno Matias
Vamos terminar o exercício com a décima sessão da assembleia da Universidade de Verão. No Governo está o Grupo Roxo, o Grupo Laranja é a Oposição 1 e o Grupo Azul a Oposição 2. Temos na agenda a discussão de uma proposta do Governo para a saída de Portugal da NATO. Vou dar a palavra por cinco minutos ao senhor Ministro José Ramos Andrade. Tem a palavra por cinco minutos.
 
José Ramos Andrade

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República

Exmo. Senhor Primeiro-Ministro e demais membros do Governo

Senhoras e Senhores Deputados

 

Dirijo-me hoje a V. Exas. na minha qualidade de Ministro de Estado e da Defesa Nacional para voz apresentar a presente resolução do Conselho de Ministros que tende a recomendar à Assembleia da República a saída imediata de Portugal da NATO.

 

A segurança global e a segurança regional são hoje tidas como importantes dado o alargar da tensão do Médio Oriente e na Europa do Leste. À exceção de grupos radicais islâmicos, e de grupos separatistas pró-russos, têm gerado recentes conflitos armados no seio dos países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte.

 

Portugal é membro efetivo e foi um dos membros fundadores do tratado que inclui a NATO. À data, a fragilidade dos países europeus, as necessidades de segurança coletiva, os medos que pairavam na Europa no final da Segunda Grande Guerra, e a instabilidade que se fazia sentir da região do Atlântico Norte deram mote à união dos países e à criação de mecanismos de segurança.

 

Portugal aderiu à NATO, embora tenha estado neutro durante a Segunda Guerra Mundial.

 

Em relação à Rússia, alguns países de leste organizaram-se nos termos do Pacto de Varsóvia. Esta cooperação militar a leste da Europa ficou ainda marcada pelo muro de Berlim e pelo período da Guerra Fria.

 

Os tempos mudaram, caindo o Muro de Berlim em 1981. Embora este tenha sido desmontado em 1989, a Guerra Fria manteve-se até 1991.

 

Com o fim do Pacto de Varsóvia, que pôs fim à Guerra Fria, ruiu totalmente o Muro de Berlim, e a NATO perdeu totalmente o seu interesse útil.

 

A NATO dispõe de um orçamento infindável, de recursos e encargos astronómicos. E são os países membros do tratado que o suportam.

 

Entendemos, porém, que a NATO está a operar para além dos limites geográficos do tratado. Está a interferir com países que nada têm que ver com os destinatários do tratado.

 

Portugal é igualmente membro da União Europeia e essa qualidade não deve ser esquecida.

 

Portugal vive hoje uma das maiores crises financeiras de sempre. Está hoje sob a assistência económica e financeira do FMI, do BCE e Comissão Europeia.

 

Podem dizer que a intervenção acabou mas a verdade é que enquanto estivermos sob vigilância da troika estaremos sempre sob intervenção. Portugal tem hoje dificuldade em cumprir os seus compromissos. E, pese embora o conceito estratégico de Defesa Nacional recomende o reforço das boas relações com a NATO, em momento algum indica a forma de financiamento a essa estrutura.

 

Este Governo entende ser necessária a saída de Portugal da NATO. Porque não há riscos diretos e iminentes para a estabilidade e segurança de Portugal; porque os recursos que a NATO consome aos cofres nacionais é claramente elevado; e porque é competência da União Europeia assegurar políticas de defesa e de segurança.

 

Nos termos do artigo 21º do Tratado da União Europeia, cabe à União assegurar a política externa e segurança comum. Podendo a União Europeia ser parte de organizações internacionais de defesa e segurança.

 

Assim, entende o Governo que deve ser a União Europeia a providenciar a sua adesão à NATO, E junto dela organizar os meios humanos e materiais necessários à continuação dos objetivos do tratado da NATO.

 

Sendo as matérias relativas à defesa e segurança de competência absoluta da Assembleia da República, não sobra outra alternativa ao Governo que não a apresentação desta resolução do Conselho de Ministros para a discussão da saída de Portugal da NATO.

 

Muito obrigado.

 

 

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. A palavra agora para o senhor deputado do Grupo Laranja, João Carlos Ferreira, para uma interpelação ao Governo. Dispõe de três minutos.
 
João Carlos Ferreira

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República

Senhores membros do Governo

Senhoras e Senhores Deputados

 

Senhor Ministro, eu gostaria que o senhor me elucidasse a mim, e aos restantes membros desta casa, que tipo de documento é este.

 

Então o senhor apresenta uma proposta de resolução de Conselho de Ministros??? O senhor ou apresenta uma proposta de lei ou uma resolução do Conselho de Ministros!

 

É que isto nem é carne nem é peixe!

 

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 

O Orador

Isto é uma ilegalidade, senhor Ministro.

Se já foi aprovado, por que motivo o traz à Assembleia?

 

O senhor Ministro refere no documento o alargar das tensões na Europa de Leste. Caso o senhor Ministro não saiba, houve um acordar de cessar-fogo entre a Ucrânia e os rebeldes pró-Rússia no dia 5... o seu documento foi feito no dia 4.

 

A seguir, fala num receio de conflitos armados. Receio, senhor Ministro? A NATO tem como principal propósito a defesa dos seus membros...!

 

Depois fala sobre a queda do Muro de Berlim em 1981. Desculpe que lhe diga mas isso é uma frase à aluno da Independente: o Muro de Berlim acabou em 89.

 

[APLAUSOS]

 

Depois fala de orçamentos infindáveis, de recursos megalómanos e de encargos astronómicos. Se assim é, qual é o problema? Só demonstra que a NATO tem capacidade para defender os seus membros.

 

Diz que Portugal está hoje sob assistência económica e financeira: não devemos estar a viver no mesmo país! É que Portugal, com a ajuda dos portugueses, concluiu com sucesso o seu programa de assistência económica em maio deste ano!

 

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 

O Orador

Quanto aos encargos financeiros que Portugal tem com a NATO, representam apenas 1,1% do PIB.

 

O senhor diz que não há riscos diretos e imediatos para a segurança de Portugal. Ora, senhor Ministro, o Estado Islâmico referenciou Portugal como objetivo a conquistar dentro de 3 a 5 anos. Isso não representa uma ameaça para V. Exa.? Creio que representará.

 

Nuno Matias

Tem de terminar.

 

O Orador

O senhor também fala das competências da UE para assegurar políticas de defesa e segurança. Então se a UE não tem um exército próprio, como poderá tratar da defesa dos Estados-Membros?

 

[APLAUSOS]

 

Para terminar, senhor Ministro... [ORADOR INTERROMPIDO PELA MESA]

 
Nuno Matias
Peço imensa desculpa mas tem de terminar, Obrigado. Tem a palavra, por três minutos, o deputado Filipe Moreira, do Grupo Azul.
 
Filipe Moreira

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República

Senhores membros do Governo

Senhoras e Senhores Deputados

 

Após a apresentação desta proposta, resta-me perguntar ao senhor Ministro que país pensa estar a governar? E em que realidade vivem os senhores?

 

Essa falsa sensação de paz que os senhores vendem é apenas uma ilusão conveniente, irreal e preocupante da noção que os senhores têm dos confrontos que nos rodeiam no mapa geopolítico do mundo.

 

Para além da ainda recente instável situação dos confrontos na Ucrânia, devem ter-se porventura esquecido que o Estado Islâmico do Iraque e do Levante, a violentajihad, prevê daqui a quatro anos ocupar Portugal e Espanha, recuperando a ideia do domínio do império muçulmano. E eu pergunto-lhe, senhor Ministro: não há perigo?

 

Não deixa de ser curioso que o senhor compare o armamento e a capacidade militar da NATO com a Europa. Se acha que a percentagem do PIB que pagamos para continuarmos na NATO é elevada, imagine o senhor Ministro o hipotético orçamento que seria remimililitarizar o país e a Europa.

 

[RISOS E APLAUSOS]

 

A ingenuidade e a incapacidade visionária vai caraterizando a postura deste Governo.

 

Por fim, esta medida mostra, mais uma vez, a podridão de caráter e o vazio de valores que infelizmente abunda na sociedade e se espelha perfeitamente neste Governo, vendendo a soldo o nosso país, fragilizando-o para sustentar a vossa política vergonhosa, tanto economicamente como para a defesa nacional.

 

[APLAUSOS]

 

Eu relembro, senhor Ministro, que Portugal não é uma empresa. É um país. E a Bancada Parlamentar do Grupo Azul estará sempre disposta ao diálogo. Sabe para quê? Para que daqui a quatro anos não tenhamos o dobro do trabalho a emendar a vossa política destrutiva!

 

Muito obrigado!

 

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Para responder, passo a palavra ao senhor Ministro Pedro Carvalho Esteves. Dispõe de 3 minutos.
 
Pedro Carvalho Esteves

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República

Senhoras e Senhores Deputados

 

Portugal faz parte da União Europeia e da NATO. Financiamos a NATO e a União Europeia.

 

A União Europeia tem uma política externa e de segurança comum, que é financiada pelos Estados Membros. Portugal paga duas vezes o mesmo serviço.

 

Em segundo lugar, a NATO não tem também um exército próprio. Nem Exército, nem Marinha, nem Força Aérea. Depende das comparticipações militares, humanas e materiais de cada um dos Estados-Membros.

 

Por último, o esforço financeiro que Portugal faz para se manter na NATO, implica não só um esforço financeiro com as missões como um esforço financeiro ao nível do armamentostandardda NATO. O que implica comprar submarinos, helicópteros, coisas do género, que - para além do que pagamos à própria NATO, corre por conta do Estado Português.

 

Portanto, a NATO é um sorvedouro de dinheiro público português que todos nós temos de pagar.

 

Não entendo o argumento financeiro por uma simples razão: são os senhores da oposição que contestam as medidas de orçamentais impostas, que estão contra o aumento de impostos, mas são esses impostos que financiam a manutenção de Portugal na NATO e a adequação dos nossos meios militares aos da NATO.

 

Quanto ao senhor deputado do grupo laranja, tem efetivamente razão. O Muro "físico” caiu efetivamente em 89 mas o Muro ideológico que separava a Europa de Leste da Europa Ocidental só caiu em 91, com o fim do Pacto de Varsóvia. Ele esteve lá sempre. As pessoas não o viam mas ele estava lá.

 

[APLAUSOS]

 

Mas o senhor deputado falou efetivamente com razão.

 

Devo dizer que esta proposta de resolução teve de ser feita de forma muita rápida. Como sabem, no dia 4 recebemos da Cimeira da NATO – realizada em Cardiff – duas resoluções do Conselho da NATO sobre o reforço do financiamento da NATO e a intervenção militar da NATO no Médio Oriente, bem como algum reforço face à Rússia.

 

A intervenção no Médio Oriente está para além da competência geográfica da NATO, porque eu desconheço que o Atlântico passe ali na zona da Síria. Ou na zona do Iraque. Mas, em todo o caso, é uma posição e iremos tê-la em atenção.

 

Muito obrigado.

 
Nuno Matias

Muito Obrigado.

 

Terminámos o debate. Vamos agora à votação.

Quem considera que o Governo ganhou o debate levante o braço.

Quem considera que a Oposição 1 ganhou o debate levante o braço.

Quem considera que a Oposição 2 ganhou o debate levante o braço.

 

Venceu a Oposição 1 com 22 votos, contra 21 da Oposição 21

 

[APLAUSOS]

 

Vamos à segunda votação. Quem entende que Portugal deve sair da NATO?

 

É inequívoco.

 

Passo agora a palavra à Joana Barata Lopes.

 
Joana Barata Lopes

Quero agradecer-vos e ao magnífico reitor, grande amigo Carlos Coelho, por me ter convidado a estar aqui hoje.

 

Eu fui aluna há oito anos, estou a ficar velha – não se nota, é evidente [RISOS]. De lá para cá tive a oportunidade de ir acompanhando, de uma maneira ou de outra, a Universidade de Verão.

 

Convosco, já são mais de mil as pessoas que por aqui passaram. Vocês hoje, quando estão aqui a simular o vosso exercício de Assembleia, estão a simular o vosso e o de mais de mil alunos que por passaram nestes onze anos.

 

Vocês vão lembrar-se de muitas coisas. Na primeira semana vão lembrar-se de tudo o que não dormiram, mas aquilo de que se vão lembrar mais vezes não é de quem ganhou ou perdeu o que quer que fosse. Vão lembrar-se, sim, de alguém que vos estendeu a mão quando estavam a desanimar, quando alguém não dormiu para estar ao pé de vocês, quando alguém vos pagou um copo porque gosta da vossa companhia.

 

Fazer política é isso. Não é a qualidade de vezes que nós acertamos naquilo que queremos dizer mas a forma como conseguimos lidar com as pessoas diferentes que estão à nossa volta.

 

E aquilo que vão levar da UV é isso: a capacidade de fazer política livremente, onde são convidados por professores de excelência a pensar pela própria cabeça, e a capacidade de o fazer com pessoas que não concordam necessariamente convosco. E é aí que vocês são postos à prova.

 

Obrigada por, por mais um ano e pelos outros mil e tal que por aqui passaram, terem empenhado tudo o que têm nesta semana que agora acaba.

 

Por fim, quero agradecer de forma muito especial ao Carlos Coelho. Na vida há pessoas que nos vão ajudando de uma maneira ou de outra. Umas que nos apoiam numas batalhas e não nos apoiam noutras. Isso faz parte. Depois, há aquelas pessoas que ao longo da nossa vida estão sempre lá, disponíveis para nos ensinar. Francamente, eu não sei porquê, mas muito obrigada por isso.

 

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Passo agora a palavra ao nosso painel de comentadores.
 
Duarte Marques

Creio que fechámos esta sessão com chave de ouro.

 

Antes de mais, quero fazer uma recomendação. Não se cumprimenta o resto dos deputados na pessoa do Presidente ou da Presidente. Eu não vejo mal nenhum mas não é da praxe parlamentar em Portugal.

 

A proposta do Governo foi bem criticada pela oposição pelas falhas que tinha. De facto, o Governo não faz recomendações à Assembleia. O Governo propõe ou pede autorização para legislar. Poderiam ter optado por pôr isso no Programa de Governo que era muito mais simples. E é essa a técnica habitual na UV: aproveitar o Programa de Governo para dizer tudo, que é o mais fácil. Não cria problemas.

 

Eu concordo com a votação do público. Eu acho que a Oposição 1 ganhou o debate, acho que o Filipe foi beneficiado pelo lapso que teve, porque acharam graça e ele reagiu bem, rindo-se. Teve piada.

 

Acho que é inaceitável, Filipe, um tipo do colégio militar não conseguir dizer essa palavra. Se eles souberem vai gozar contigo.

 

Mas tiveste e reagiste bem. Saber reagir é muito importante e ganhaste a simpatia do público. Tiveste boa voz e bons argumentos.

 

Acho que a Oposição 1 foi muito mais certinha, teve bons argumentos, tu és um bom comunicador. Estiveste muito bem na intervenção e acho que mereceste ganhar. Foi por uma nesga mas os argumentos estavam bem preparados, foste muito mais certo do que o Filipe. O Filipe teve momentos muito bons mas a oscilar mais.

 

Tu foste limpinho.

 

Na resposta, o Governo demonstrou uma grande ginástica mental com aquela reação ao Muro de Berlim. Eles apontaram um erro inaceitável, até awikipédiaacerta nessa data, mas a forma como tu foste justificar isso nem o prof. Marcelo.

 

[RISOS]

 

Eu nunca te vou comprar colchões, porque tu aldrabas muito bem. Nunca pensei que fosse possível sair bem disso. O "Muro ideológico” é de morte.

 

[APLAUSOS]

 

Voltando ao João. Vocês não devem ter percebido mas o Filipe, depois de se atrapalhar começou aos berros ao microfone. Vocês não viram mas houve um gesto que simboliza a Universidade de verão que foi o João a agarrar nele e a puxá-lo para longe do microfone. O João estava a disputar com ele a vitória neste exercício. Eles não viram lá atrás mas quem afastou o Filipe do microfone foi o João.

 

[APLAUSOS]

 

Termino dando-vos os parabéns pela UV toda e dois conselhos.

Aqueles que não estiveram tão bem aqui, e que acharam que os outros foram melhores, aprendam com os erros. Não desperdicem a oportunidade de aprender com os erros.

 

Aqueles que estiveram muito bem, ai de vocês que se deslumbrem. É muito fácil deslumbrarmo-nos e falharmos.

 

Já vi muito jogador de futebol a fazer maravilhas com 15 anos e nunca passaram do INATEL. E o potencial aqui de não passar do INATEL é muito grande. Como o potencial de chegar longe, sem esquecer o mais importante. E se eu tiver que simbolizar o espírito da Universidade de Verão, ele está no gesto de há pouco do João. Um gesto que qualquer um de vós aqui faria.

 

Não desperdicem a oportunidade de aprender e corrigir e não se deslumbrem com o que fizeram.

 

Boa sorte.

 

[APLAUSOS]

 
Dep.Carlos Coelho

Sobre esta assembleia o Duarte já disse tudo e eu assino por baixo.

 

Queria apenas dar algumas notas finais.

 

A primeira para agradecer à Joana e ao Nuno a forma competente e rigorosa como dirigiram a Assembleia. Nunca se gosta de ficar com a imagem dos "maus”, nós pedimos-lhes isso e eles fizeram-no bem.

E agradeço uma vez mais a vossa disponibilidade para participarem neste exercício.

 

[APLAUSOS]

 

Depois, queria dar-vos os parabéns. Acho que foi a primeira vez, em tantos anos de UV, que tivemos tantos Programas de Governo como outros instrumentos. Não estou a dizer que os instrumentos estavam sempre bem, mas eu sei que é mais difícil fazer uma proposta de lei ou uma resolução do Conselho de Ministros do que escrever um documento político. Geralmente, há seis ou sete Programas de Governo e vocês tiveram cinco. Ou seja, metade dos grupos foi para a solução – se quiserem – mais fácil, e outra metade para a mais difícil. Isso demonstra que vocês trabalharam e por isso são credores da nossa admiração.

 

Espero que tenham ganho alguma coisa com este exercício de antecipar argumentos. Num processo político, nós não temos de elaborar apenas a nossa razão. Temos de conseguir analisar qual a razão dos outros. Não apenas para nos podermos defender num debate parlamentar mas para pesar se temos ou não razão.

 

Muitas vezes a realidade tem vários ângulos e quem insiste em ver a realidade só de um ângulo acaba por cair no campo do fundamentalismo.

 

Grande parte da guerra que existe ao nível mundial é porque há pessoas tão ancoradas no seu fundamentalismo (religioso, político...) que não veem que os outros também podem ter razão.

 

Portanto, espero que este exercício tenha ajudado a nunca se esquecerem disso.

 

Há quatro mensagens finais que vos queria deixar.

 

A primeira é que vocês trabalharam em grupo e trabalharam em stress. Hoje trabalhar em grupo é uma inevitabilidade. Nós não estamos sozinhos. As coisas que podemos fazer com mais densidade, nunca as fazemos sozinhas. Fazemos sempre com outras pessoas. E a vida é um stress permanente.

 

Espero que neste momento vocês tenham percebido por que razão a estrutura da UV vos "obrigou” a trabalhar em grupo e em stress.

É uma aprendizagem essencial para a vida moderna.

 

Em segundo lugar, nós sabemos bem que trabalhar em equipa comporta tensões. Nós sabemos isso, Vocês são todos pessoas inteligentes, e com experiência de vida: basta haver duas pessoas numa sala para haver tensão.

 

Nós temos tensões com os nossos pais, irmãos, amigos, com namoradas/os, a tensão faz parte da vida. A forma como se gere a tensão é muito importante. E há uma tensão no preparar deste assembleia. Eu não acompanhei os vossos grupos, os vossos conselheiros fizeram-no, imagino que tenha havido tensões naturais.

 

Primeiro porque estamos convencidos de que somos a melhor pessoa. E temos algumas dificuldade para admitir que os nossos colegas de grupo nos digam que o melhor não somos nós mas outro. Em segundo lugar, porque ainda que todos considerem que eu sou o melhor, pode haver outras razões que impeçam que eu seja o porta-voz na assembleia. O grupo pode dizer-nos: "sabemos que tu gostarias de falar na assembleia mas é muito importante que faças tu a pergunta ao Prof. Marcelo”. Ou seja, o Grupo pode gerir os recursos humanos de maneira diferente daquela que é a vossa vontade.

Portanto, vocês viveram estas tensões, aqui, na UV. Agora imaginem o que é trabalhar num partido, numa autarquia, na AR, no PE, no Governo.

 

As tensões são inevitáveis – porque fazem parte da vida, mas são muito mais complicadas de gerir. Portanto, a ideia de que a política se pode fazer sem tensão é tão absurda como presumir que podemos viver sem tensão. A tensão faz parte da vida e da política.

 

Em terceiro lugar, é possível que alguns de vocês tenham ficado desiludidos com a vossa prestação. Tenham saído do palco a achar que não estiveram bem. Mas foi aqui. Foi entre amigos, em família. À porta fechada, sem jornalistas na sala. Eles não estão autorizados a estar nas simulações de assembleia nem nos trabalhos de grupo. Para vocês estarem à vontade.

 

Mas isto é mesmo assim: a primeira vez é difícil, a segunda ainda é, quantas mais vezes vocês falarem em público, mais à-vontade ganham e mais erros corrigem, se tiverem a humildade de o fazer como o Duarte sublinhou. Portanto, não se deixem ir abaixo se não gostaram da vossa prestação. Percebam que para a próxima será melhor, e a seguinte ainda melhor, se soubermos aprender com os nossos erros.

 

Finalmente. Podem poder ter achado que algumas críticas e comentários que eu e o Duarte fizemos foram cruéis ou injustos. Isso é perfeitamente legítimo. Primeiro porque nós podemos não ter razão.

Mas vamos ser claros, na vossa vida política ou intervenção social, vocês terão outros críticos que serão mais cruéis do que nós. Terão as críticas dos vossos amigos, dos familiares e dos eleitores. E, muitas vezes, a crítica do eleitorado é muito cruel e injusta.

 

Mas como eu dizia no Falar Claro "aquilo que nós dizemos não é o que nos sai da boca mas aquilo que os outros ouvem”, na atividade política é mais ou menos o mesmo. Aquilo que nós somos capazes de fazer não é exatamente aquilo que nós fazemos mas aquilo que os outros têm a perceção que nós fizemos.

 

Portanto, o julgamento dos outros é sempre o julgamento que interessa. Nós podemos achar que somos os piores do mundo e todos os outros acharem que somos os melhores. Ou vice-versa.

Como numa democracia quem manda é o eleitorado, são eles que decidem. Eles é que são os juízes, a opinião deles é que conta.

 

Dito isto, em nome do Duarte e no meu, desejo-vos muita sorte na vossa vida pessoal e política.

 

[APLAUSOS]

 

Vozes

JSD! JSD! JSD!

 

 

 

[APLAUSOS]